Depois de chegarmos até o ponto mais ao norte do continente europeu, em Nordkapp, decidimos que era hora de cumprir mais uma missão.
Dirigimos até Senja, a segunda maior ilha da Noruega, onde estão localizados o Parque Nacional de Ånderdalen e algumas comunidades pesqueiras tradicionais. Percorremos todo o oeste da ilha e cruzamos por um túnel de pedra muito antigo até o pequeno vilarejo de Fjordgård.
Nosso objetivo por lá era ousado. O plano era fazer um trekking para a base da montanha Segla.
Já sabíamos antecipadamente que esta não seria uma tarefa fácil. O site oficial da Noruega avisava que a estação para fazer a trilha ia até setembro apenas e nós estávamos em pleno mês de novembro, quando possivelmente o percurso estaria vazio e coberto de neve.
Subir sozinhos uma montanha no Ártico nesta época do ano não foi uma decisão muito racional, mas o dia estava lindo e não podíamos deixar passar esta oportunidade. Este seria nosso último desafio no norte, prometemos para nós.
Sem nenhuma indicação e ninguém nas ruas da aldeia para nos dar informações, paramos o carro logo atrás do estacionamento de uma escola. Finalmente encontramos uma discreta plaquinha de madeira indicando o caminho. Trocamos de roupa, equipamos uma mochila com alguns snacks, meias quentes e apetrechos de trekking, os quais não fazíamos ideia para o que serviam. Pegamos nossos bastões e começamos a caminhada. Alguns passos depois, analisando melhor o GPS do celular, descobrimos que não estávamos na trilha correta.
Voltamos a pé o trajeto até a escola e conseguimos conversar com uma jovem que passava na calçada. Com um pouco de dificuldade de se comunicar em inglês conosco, ela nos disse que deveríamos cruzar toda a rua principal da vila e, na última esquina, estaria o começo da trilha. Antes de ir embora, ela ainda nos alertou que provavelmente não haveria ninguém subindo a montanha aquele dia.
Caminhamos entre as casinhas coloridas da cidadezinha até o ponto indicado. Outra singela placa de madeira marcava o começo da trilha, desta vez a correta. Olhamos para ela e nos demos conta de que o caminho era muito íngreme e estava coberto por neve. Pensamos um pouco e decidimos seguir alguns metros só para ver no que dava.
Já no começo, tivemos um pouco de dificuldade de visualizar o trajeto por conta da neve. Gradualmente o relevo foi ficando mais inclinado e estava impressionantemente difícil dar um passo sem escorregar. Nossas botas claramente não tinham a tração necessária, o ideal era estar com sapatos apropriados para andar no gelo.
Apesar disso, conseguimos nos acostumar com os trechos escorregadios e fomos avançando. Quando alcançamos o primeiro platô, paramos um pouco para descansar. Até ali, devíamos ter subido cerca de trezentos metros em somente um quilômetro e meio de trilha. Conseguíamos enxergar, lá embaixo, as casinhas bem pequeninas alojadas entre a cordilheira e o mar aberto.
Neste momento, o celular parou de funcionar por conta do frio e sentimos muita falta do GPS de trilhas que nos roubaram na Colômbia, logo no começo da viagem.
Mesmo assim decidimos continuar a missão. Caminhamos alguns metros pelo platô e já conseguimos avistar a imponente Segla. Estávamos chegando pela face norte e esta pontiaguda montanha ia tomando forma para nós.
Passado o platô, tivemos que traçar o caminho por conta própria, seguindo sempre por cima das pedras maiores, desviando das fendas. Em uma parte do percurso, vimos as pegadas do que parecia ser uma raposa e decidimos seguir os passos dela.
Apesar do céu azul, o sol baixo estava escondido atrás da Segla e a temperatura chegava a quinze graus abaixo de zero. Por várias vezes, pensamos que iríamos escorregar montanha abaixo. Se não fosse pelos bastões, não teríamos conseguido nos equilibrar.
Seguimos assim por quase uma hora, até conseguirmos avistar praticamente toda a face norte da montanha. Sentamos por alguns minutos para descansar e contemplar a paisagem. Naquele momento, a aventura e o risco que estávamos correndo fez sentido para nós.
Ao leste da Segla, lá embaixo, estava o mar e o vilarejo de Fjordgård. Do lado oeste, o sol tocava a montanha e era possível ver uma parte de um lago azulado.
Subimos os metros finais escalando, usando as mãos para impulsionar o corpo e travando os pés. Alcançamos o cume da montanha Hesten e o nosso troféu estava bem ali à nossa frente!