O nosso último destino deste mochilão pelo Brasil foi Lagoa Santa, em Minas Gerais. O que nos levou à cidade é nossa busca incessante por conhecer os registros históricos dos povos antigos que habitaram as Américas.
A cidade recebeu este nome devido a uma lagoa que tinha o poder de cura. O primeiro tropeiro que explorou a região, Felipe Rodrigues, teve suas feridas rapidamente cicatrizadas após um banho em uma lagoa da região. Após este acontecimento, a fama da lagoa se espalhou por todo o Brasil (inclusive para o mundo) e atraiu a visita de inúmeros peregrinos em busca da cura de doenças. Por isto, a cidade recebeu o nome de Lagoa Santa. Mais tarde, pesquisas científicas confirmaram que existiam minerais e uma espécie de alga que, em contato com as feridas, acelerava o processo de cicatrização.
O Parque Estadual do Sumidouro, em Lagoa Santa, é um importantíssimo sítio arqueológico a céu aberto. E foi neste lugar que se estabeleceu, em 1832, o renomado arqueólogo dinamarquês, Peter Lund.
Lund, durante vários anos em Lagoa Santa, fez descobertas importantíssimas. Ele explorou mais de 800 cavernas na região e encontrou resquícios arqueológicos em mais de 70 delas. Peter Lund acreditava, mais de um século antes que qualquer pesquisa científica comprovasse tal crença, que o Homem Americano havia convivido com os animais da megafauna, entre eles a Preguiça Gigante, o Tigre-Dente-de-Sabre e o Mastodonte. Em suas descobertas, encontrou ossadas do homem ao lado de restos mortais destes animais. Até hoje, esta teoria é rejeitada por inúmeros arqueólogos, que acreditam que homem entrou nas Américas pelo Estreito de Bering (canal entre a Rússia e o Alasca), a cerca de 10 a 12 mil anos atrás, aproveitando-se da glaciação do mar. Assim, seria impossível eles terem convivido com os animais da megafauna, já que estes foram extintos antes do suposto período de ocupação das Américas.
Em nossa passagem pela Serra da Capivara, no Piauí, também pudemos acompanhar inúmeras descobertas que confirmam que o Homem ocupa as Américas há mais de 12 mil anos do presente. Segundo estudos conduzidos pela arqueóloga Niéde Guidón, restos de fogueiras e ferramentas encontradas podem ter mais de 50 mil anos. Um quebra-cabeça sem fim para os pesquisadores da área. Por estas e outras, que a pesquisa de Lund foi tão importante e colocou o Parque do Sumidouro na rota de aventureiros e pesquisadores de todo o mundo.
Foi no Sumidouro que ocorreu uma das descobertas mais importantes das Américas: o Homem de Lagoa Santa, representado legitimamente pelo fóssil denominado de Luzia, uma habitante de mais de 11.500 anos do presente. Luzia é o mais antigo esqueleto humano encontrado no continente. Além disso, o que mais intrigou os arqueólogos é o fato dela possuir traços negroides e não mongoloides, como os habitantes da América do Norte. Esta descoberta reforçou muito a hipótese de que os primeiros habitantes das Américas vieram da África, aproveitando-se de técnicas antigas de embarcações e da menor profundidade dos oceanos na época, o que acarretou a formação de inúmeras ilhas (que atualmente estão submersas). Assim, eles vieram pulando de ilha em ilha, até que chegaram ao novo continente.
Além de todas estas descobertas importantíssimas, Lagoa Santa também abriga inúmeros sítios com pinturas rupestres, que datam de até 9 mil anos do presente. Desde a nossa visita na Cueva de las Manos, na Argentina, descobrimos esta paixão e viramos “Caçadores de Pinturas Rupestres”.
Inúmeras representações estão ilustradas nas grutas da região. Os animais típicos da época, contagens, rituais do grupo e até um X estão desenhados pelos paredões rochosos. Na Serra da Capivara também se encontra a ilustração de um X, o que indica que esta era uma forma de demarcar o território ou algo do gênero.
Inscrições rupestres (que é quando a rocha é riscada, causando orifícios na mesma) também são comuns em Lagoa Santa. Este é um forte indicativo que os homens pré-históricos já dominavam ferramentas poderosas, que eram capazes de realizar tal trabalho.
Desviando um pouco da trilha, mas próximos da gruta, encontramos restos de cerâmicas e ferramentas, que datam de cerca de 2 mil anos do presente. Uma surpresa para nós e um demonstrativo que ainda há muito que descobrir no Parque do Sumidouro e sobre a ocupação humana nas Américas.